– Artigo publicado no jornal número 1 (Abril/Maio 2023) da Alternativa Socialista Internacional em Portugal –
A luta contra a reforma das pensões
O governo do presidente Macron lançou a sua reforma das pensões: um aumento da idade de reforma dos 62 anos para os 64, e do requisito de serviço mínimo para uma pensão inteira dos 41 anos de descontos para os 43. Mais de 70% da população opõe-se a esta reforma e recusa o argumento de que o Estado francês não encontra 10 mil milhões € por ano para a sustentabilidade da segurança social, quando gasta 157 mil milhões € por ano em ajudas públicas a empresas. Dada a oposição generalizada a este ataque, o governo de Macron teve de usar o artigo 49.3 da constituição para o aprovar. Trata-se de um método anti-democrático que permite passar políticas ignorando o parlamento. É a 11ª vez que este governo o usa, no intervalo de menos de 1 ano.
Em resposta ao ataque às pensões, as 8 maiores organizações sindicais de França uniram-se numa frente comum, algo que não acontecia desde 2010 (quando a idade de reforma subiu de 60 anos para 62). Desde 19 de Janeiro que milhões de trabalhadores têm estado em greve e manifestação. Foram mais de 2 milhões no primeiro dia de manifestação, número que tem aumentado até 3,5 milhões em várias datas nos últimos 3 meses. Foi a luta que criou uma relação de forças que impediu o governo de ousar um voto no parlamento. A luta mantém-se pela frente sindical mesmo depois da lei estar aprovada.
Membros da ASI participaram nos protestos em Paris. O ambiente era muito combativo e havia um desejo genuíno de parar Macron e ir mais longe, em paralelo com uma compreensão de que manifestações não são suficientes e é necessária uma estratégia de escalamento para ganhar.
Macron e o seu governo estão mais fracos que nunca. É por isso que a brutalidade policial está a ser crescentemente usada. O uso de gás lacrimogéneo é generalizado e multiplicam-se as queixas por detenções arbitrárias pela polícia, arrastamentos pelos cabelos e assédio sexual. O objetivo do governo com isto é, por um lado, aumentar o nível de violência dos protestos na esperança de semear divisão no campo que luta e, por outro lado, tentar assegurar a coesão das forças repressivas do Estado, num momento em que a maioria da população apoia a luta.
A luta continua. Há que construir a greve geral por tempo indeterminado.
Os ataques às pensões e a política do presidente Macron e da primeira-ministra Borne não serão derrotados através de moções de censura e de referendos, mas através da luta! A raiva após o uso do 49.3 e a motivação para derrubar o ataque às pensões deve tornar-se num apelo a uma greve geral de duração indefinida, renovável por votação diária. Segundo sondagens, o apoio popular a uma greve deste tipo ronda os 60%, e cerca de 70% quer que o movimento continue. Este reservatório de mobilização não deve ser perdido!
Alguns bastiões do movimento operário lançaram já a greve por tempo indeterminado: ferrovia (SNCF), transportes públicos de Paris (RATP), energia (EDF), refinarias, coletores de lixo, escolas. Mas como sustentar este ímpeto, e estendê-lo a setores menos mobilizados?
A simples sucessão de dias de greve e mobilização não é suficiente. Os comités de greve e de ação devem ser estendidos a mais locais de trabalho, abertos a todos os colegas, juntamente com comités semelhantes em escolas e bairros, para ligar as várias iniciativas de luta. A organização a uma escala maior possibilitaria o envolvimento de todo o apoio ao movimento e a tomada democrática de decisões. Uma luta como a que estamos a assistir não se confronta só com a reforma das pensões: trata-se da queda de Macron e Borne e da sua política austeritária e da confrontação com o estado capitalista.
Por uma sociedade dirigida pela maioria e para a maioria
Não há falta de recursos! A TotalEnergies obteve um lucro líquido de 19 mil milhões € em 2022, as empresas do CAC40, as maiores empresas francesas, distribuíram 80 mil milhões € em dividendos aos seus acionistas, enquanto o Estado distribuiu 157 mil milhões € em ajudas a empresas por ano!
Estas empresas deviam ser nacionalizadas sob controlo e gestão pelos trabalhadores. Com a nacionalização de setores chave da economia, seria possível assegurar um futuro digno para todos, com respeito pelo clima, graças à planificação racional e democrática da economia. A classe trabalhadora organizada é quem pode tomar o papel principal neste processo, envolvendo os restantes movimentos sociais no processo democrático. A tomada de poder pela classe trabalhadora em França poderia contribuir para o início do fim do sistema capitalista no mundo. Com este programa e abordagem, a France Insoumise (maior partido de esquerda em França e maior impulsionador da luta atualmente) poderia cumprir o papel de plenamente estimular a oposição a Macron e de transformar a sociedade no seu todo.
Com as ações “Robin dos Bosques”, os trabalhadores da energia em greve estabeleceram gás e eletricidade gratuitos para escolas, hospitais, habitação social, centros públicos de desporto e associações de interesse público de forma coordenada no país. Também restabeleceram a distribuição de energia a quem ela tinha sido cortada por contas em atraso e ofereceram uma tarifa reduzida até 60% a pequenos comerciantes. Estas ações são tomadas e coordenadas democraticamente nos locais de trabalho, e formam uma poderosa ilustração de como a riqueza produzida pelos trabalhadores pode ser gerida numa sociedade socialista democrática!