– Editorial do jornal número 6 (Setembro/Outubro de 2024) do coletivo Luta pelo Socialismo –
“Mais Saúde Habitação Privatização” é o programa deste governo
Estamos nas vésperas da apresentação do Orçamento do Estado para 2025 e a única certeza é que, quer a AD consiga incluir a descida de IRC e o IRS Jovem nos acordos, quer faça ajustes aos mesmos até que o PS aprove o OE, estamos perante um governo de políticas escancaradamente de privatização e serviço aos grandes interesses económicos, em continuidade com o governo do PS anterior mas em modo acelerado. A AD está empenhada em comprometer o PS e, mesmo cedendo em parte nas suas bandeiras eleitorais, continuará a implementar um programa de direita com toda a subserviência ao capital.
Conseguimos vê-lo na degradação planeada do SNS, através da criação dos Centros de Atendimento Clínico (CAC), que desviam profissionais de saúde dos serviços já existentes e sobrecarregam-nos com mais horas extra, sendo que um deles já foi entregue a privados. As 20 unidades de saúde familiar privadas anunciadas são apenas a ponta do iceberg do que virá. A contratação de especialistas passou a ser feita por concursos individuais de cada instituição, o que leva a abusos nas condições contratuais e a atrasos na colocação de médicos. As medidas que são de facto necessárias, de valorização dos salários e da atratividade das carreiras, de mais contratações e, para o garantir, de nacionalização dos hospitais privados, ficam pelo caminho.
Perante a galopada dos preços na crise da habitação (aumento de 7,8% em 2024 até agora, após aumentos de 8,2% em 2023 e 12,6% em 2022), o novo Governo mostra coerentemente que defende os interesses dos capitalistas e a sua necessidade de lucros. Enquanto tenta enganar-nos com descidas de impostos que em nada beneficiam a classe trabalhadora, promessas de habitação pública para um futuro distante e culpabilização vergonhosa dos imigrantes, a prioridade do Governo tem sido anular as insuficientes medidas do pacote “Mais Habitação” para dar rédea livre ao crescimento da especulação e do AL. O anúncio do descongelamento das propinas vem agravar as perspectivas de muitos estudantes do ensino superior que já vêem os seus estudos impedidos pela falta de residências estudantis e de quartos a preços acessíveis.
Não queremos migalhas, queremos carreiras!
Mas a classe trabalhadora sabe o que vale e não são as parcas migalhas de aumento do salário mínimo que irão travar as contestações que já se erguem em resposta. Nós saudamos a manifestação do coletivo Casa para Viver no dia 28 de setembro, bem como a greve conjunta de médicos e enfermeiros nos dias 24 e 25 e as greves dos técnicos auxiliares de saúde, as greves dos trabalhadores não docentes das escolas nos dias 27 de setembro e 4 de outubro e a greve dos trabalhadores da CP de dia 18 de Setembro. Todas estas greves e manifestações têm um ponto em comum – a urgente valorização e fixação dos profissionais nos serviços públicos e essenciais. A falta de habitação acessível não é só um ataque direto às nossas condições de vida, é também um dos motivos fundamentais, a par dos baixos salários e da serventia do Estado à concorrência privada, por que os serviços públicos não conseguem reter profissionais e estão a definhar. Através da greve, o movimento laboral tem força para lutar por casas em boas condições acessíveis para todos e serviços públicos de qualidade com profissionais saudáveis e motivados como parte de um grande movimento de todos os oprimidos pela melhoria das condições de vida e de defesa dos serviços públicos contra o capitalismo! O movimento pela habitação e o movimento laboral devem unir-se e, através de assembleias de trabalhadores e moradores, organizar ocupações e greves intersetoriais com um plano: temos de nos organizar e lutar para ganhar!
As condições inaceitáveis de exploração e opressão em capitalismo
A organização da classe trabalhadora é hoje fundamental face aos ataques que nos tentam dividir. As vergonhosas manifestações racistas e xenófobas previstas em Lisboa e Guimarães são consequência da naturalização do racismo e xenofobia, até agora reprimidos mas sempre presentes, nos discursos e ações políticas. A extinção da manifestação de interesse e o controlo de fronteiras mais apertado com registo de dados biométricos só contribuirão para a maior ilegalização da população migrante e a sua submissão aos grupos organizados de tráfico humano e trabalho forçado, que sustentam indústrias como a agricultura em Portugal e enchem os bolsos de muitos latifundiários.
Apesar das diversas promessas para resolver as condições deploráveis de sem-abrigo de muitos migrantes, estes continuam à mercê da chuva e sem perspetivas de resolução face ao inverno que se avizinha. São os diversos coletivos e associações locais que se têm mobilizado e organizado para proteger a dignidade destas pessoas e corretamente apontado o dedo à inércia do poder local.
Também nos incêndios que mais uma vez assolam o interior do país, se constata a força da organização das populações na defesa das suas casas e escolas, com a colaboração de todos, independentemente da origem ou idade. É inaceitável que todos os anos continuem a perecer vítimas das consequência dos interesses privados! A propriedade privada da terra não pode ser superior à vida de populações inteiras e ao equilíbrio dos ecossistemas de que dependemos. As alterações climáticas trazem desafios acrescidos mas é a gestão florestal sujeita aos interesses de grupos económicos, é a falta de investimento nos profissionais (bombeiros, gestores florestais,…) e em estratégias de prevenção que provocam as recorrentes tragédias.
Vitórias que realmente melhorem as condições de vida da maioria da população e o futuro da juventude só serão possíveis se as organizações da classe trabalhadora confrontarem o próprio sistema capitalista: se se puser em causa o direito de propriedade dos fundos imobiliários em favor da habitação pública, se se confrontar a mercantilização da saúde e educação que está a destruir os serviços públicos, se se puser a planificação florestal à frente do mercado e das indústrias de celulose, se se atacar a especulação financeira em favor da nacionalização da banca e da planificação da economia ao serviço das necessidades sociais e ambientais!